Pedro Ivo Carvalho
A Justiça portuguesa é um alvo demasiado fácil. Fundamentalmente, porque, como pilar da Democracia, se expõe, com assinalável frequência, ao ridículo, tornando visíveis, até para o mais incauto dos cidadãos, as suas debilidades e incongruências. No fundo, toda a gente percebe que não funciona como devia. Há muitos anos.
E, quando pensávamos ter visto e ouvido tudo, o país ficou a saber que a Justiça portuguesa ainda é capaz desse feito notável que é deixar-nos de queixo caído. Nem mesmo o mais empedernido dos catastrofistas arriscaria pensar que dezenas de candidatos a magistrados fossem capazes desse acto destemido que é copiar num exame de cruzinhas. E que a direcção do Centro de Estudos Judiciários (CEJ), onde se formam, numa decisão tão salomónica quão absurda, "correu" os 137 candidatos - os que copiaram e os que não cometeram a fraude - com nota dez. Passando toda a gente.
Os motivos invocados são originais: as dezenas de candidatos a magistrados não copiaram todos (ah!, que alívio...) e, como tal, seria injusto chumbá-los por junto. Portanto, a Direcção do CEJ acha que dar positiva aos que copiaram e uma nota dez aos que não copiaram mas que podiam ter tirado, no limite, 20, foi uma "sanção equilibrada". Se é este o conceito de aplicação de justiça que querem incutir nos alunos, estamos conversados. E não fosse a dimensão mediática desta trapalhada e decerto não haveria, como parece, um recuo dos decisores.
Outra justificação: como estes formandos acabariam o curso em Julho, e com as férias à porta, "repetir o teste era praticamente impossível", explicou Luís Eloy, director-adjunto do CEJ, para quem "excluir toda a gente era inimaginável [pois] trata-se de um teste entre muitos outros".
Ou seja: por ter sido num mísero exame, a reputação dos "copiões" não fica beliscada. Lição a reter: não julgues o comportamento, mas sim o peso estatístico da borrada no todo.
O drama é que são pequenos "nadas" como este que projectam, na opinião pública, a imagem de uma Justiça anquilosada, sem crédito, falida do ponto de vista moral. E não sendo todos assim, para memória futura ficam apenas os que são assim.
Os juízes, como seria de esperar, saíram em defesa da classe. "Pode ter havido algum equívoco [...] sobre a natureza individual do teste", atreveu-se Manuel Ramos Soares, da Associação Sindical dos Juízes. Dá vontade de rir.
Como dá vontade de rir a circunstância de não só estarmos a formar magistrados que copiam uns pelos outros e não são punidos, como estarmos a formar magistrados que nem sequer sabem copiar. Pelos vistos, a esmagadora maioria dos exames tinha respostas iguais. Erraram nas fáceis e acertaram nas difíceis.
Definitivamente, não aprenderam nada na escola.
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