terça-feira, junho 21

História com fim infeliz

Manuel António Pina


E, finalmente, pouco depois das 18 horas de ontem, um assomo de dignidade ou, talvez, de sentido do ridículo: Fernando Nobre afastou-se da candidatura ao cargo de presidente da Assembleia da República.
Na verdade não se afastou, foi afastado, depois de (recorde absoluto na democracia portuguesa) duas votações sucessivas nas quais nem sequer obteve o pleno do partido que o levou a votos.
Também não terá sido bem um assomo, mas apenas meio, visto que, ao contrário do que havia garantido, se irá manter na AR como comum deputado enquanto entender que "é útil ao país".
O que bem pode significar, no peculiar idiolecto político de Nobre, enquanto entender que "o país lhe é útil a si", se for para levar a sério a sua dramática afirmação de que só dando-lhe um tiro na cabeça o impedirão de chegar a Belém (no caso, com escala em S. Bento).
O resto, entre as 15 e as 18 horas, foi dos episódios mais tristes de que me lembro da nossa já longa história trágico-parlamentar. Cheguei, secretamente, a desejar que algum deputado mais cristão do CDS mudasse de cavalo a meio da corrida e lhe desse o voto por compaixão (eu, que não sou cristão, já tenho dado esmola a gente menos merecedora de compaixão do que Nobre naqueles momentos).
Só que um voto não bastava; eram precisos pelo menos 10. E mesmo num partido democrata-cristão é improvável encontrar 10 deputados mais dados à caridade que à disciplina partidária.

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