terça-feira, junho 21

Um rio que une as margens

Jorge Fiel



Nas desarrumações e arrumações que sublinharam a minha última mudança de casa (espero que seja também a derradeira, tantas as canseiras que me deu), tropecei na roupa que trouxe da tropa.
Tive imensa pena que o dólman do camuflado e as calças da farda de trabalho (muito na moda, pela cor, tecido e bolsos laterais) já não me servissem, mas não há que ter ilusões. Em trinta anos, muitas coisas se passaram não só no país e no Mundo, mas também no meu corpo.
Vem este episódio a propósito da triste teimosia dos estados- -maiores dos partidos do arco governamental em manterem o país espartilhado em roupas que já não lhe servem. A actual divisão do país em distritos, câmaras e freguesias foi feita à medida de um Portugal que no entretanto mudou completamente de figura.
É pena, porque creio que não é preciso ser um Einstein para perceber que o desenho administrativo feito numa altura em que a lista telefónica de Lisboa tinha uma dúzia de páginas não é o mais adequado para gerir eficazmente um país com 12 milhões de telemóveis, em que metade dos seus habitantes já não se lembra de que houve um tempo em que os telefones estavam presos à parede por um fio.
Mais tarde ou mais cedo (rezemos para que seja mais cedo), as circunstâncias e a troika vão acabar com o disparatado desperdício de energias e recursos que é estar no século XXI a tentar enfiar-nos num fato político-administrativo feito por medida num mundo longínquo, onde não havia auto-estradas, televisão, aviões ou Internet.
A actual estruturação autárquica do Porto fez sentido quando as famílias ricas da cidade iam passar os meses de Verão a casas alugadas na Foz, fazendo-se acompanhar de mobília, baixela e criadagem - e em que o rio Douro era um real obstáculo à circulação dos portuenses.
A profunda reforma político-administrativa do país deverá ser uma das prioridades do Governo que hoje toma posse e a principal arma que Pedro Passos Coelho tem para combater a obesidade mórbida de um Estado que está a asfixiar o país.
No intervalo entre as duas etapas do Grande Prémio Histórico do Porto 2011, Luís Filipe Menezes iniciou oficiosamente a campanha eleitoral que o levará a presidir a Câmara do Porto em 2013.
As cinco novas travessias do Douro que ontem apresentou são propostas sérias para ajudar a voltar a fazer prosperar uma metrópole nascida e unida em volta da foz de um rio que alguns políticos pouco clarividentes teimam em olhar como um obstáculo.

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