terça-feira, junho 21

Há mais na Caixa do que você imagina

Pedro Sousa Carvalho



É um ‘slogan’ publicitário da Caixa Geral de Depósitos, mas que podia ser utilizado para mostrar a forma como os sucessivos governos têm usado e abusado do banco público.
O caso mais recente, retratado na edição de hoje do Diário Económico, é mais um exemplo de que a vocação da Caixa não se limita a dar e receber crédito ou a financiar a economia e as PME. Também serve para tapar os buracos do défice. Foi assim no passado e é assim no presente.
Na sequência da transferência do fundo de pensões da PT para o Estado, que também serviu para tapar grande parte do défice do ano passado, ficou acordado que a operadora fizesse mais uma transferência de 450 milhões até 20 de Dezembro deste ano. Dada a necessidade urgente de ‘cash' nos últimos meses para pagar salários e outros compromissos, o Estado pediu à Caixa que "adiantasse" o dinheiro devido pela PT, ajudando assim a equilibrar o saldo das contas públicas.
Esta não é a primeira vez que a Caixa ajuda a desenrascar as contas públicas. Ainda todos se lembram quando em 2004, o então ministro das Finanças, Bagão Félix, aprovou a transferência de 2,5 mil milhões do fundo de pensões da CGD para a CGA para manter o défice abaixo dos 3%.
Faz-me lembrar aquela música do António Variações: "Quando a cabeça não tem juízo" a Caixa "é que paga".
Mas há mais na Caixa do que você imagina: o papel que a Caixa desempenhou no resgate ao BPN, injectando cinco mil milhões de liquidez e colocando administradores a trabalhar em ‘part time'; a recente venda do edifício sede na João XXI ao próprio fundo de pensões do banco com uma mais-valia de 103,7 milhões; empréstimos e operações com uma racionalidade económica duvidosa como a compra de 10% das acções da Cimpor ao empresário Manuel Fino, por um valor 25% superior ao do mercado; ou ainda créditos a conhecidos empresários da nossa praça para comprar acções de um banco concorrente. E não nos podemos esquecer das participações detidas pela Caixa em empresas como a PT, REN, EDP, BCP ou Zon que, em muitos casos, não têm uma lógica de investimento para rentabilizar, mas sim para parquear posições de empresas onde o Estado quer continuar a ter influência. E isto tudo para não falar dos aumentos de capital (que só contam para a dívida pública e não para o défice) que o Estado muitas vezes faz na Caixa e noutras empresas públicas para receber, por portas travessas, o mesmo dinheiro através de chorudos dividendos, estes sim a contar para o défice.
Deveríamos aproveitar a recente discussão da campanha eleitoral sobre o papel que a Caixa deveria ter na economia para, com privatização ou sem privatização, esvaziar a Caixa de todo o tipo de instrumentalização e lóbis e transforma-la num autêntico banco de fomento e com os recursos canalizados para as empresas e sectores que mais podem contribuir para as exportações e para o crescimento económico. Era já um bom começo deixar cair aquele acordo tácito que existe entre Governo e oposição, em que quando um nomeia o governador do Banco de Portugal, o outro escolhe o presidente da CGD.

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